A primeira vez que eu produzi algum conteúdo para a Internet foi em 1999 quando eu criei uma página pessoa no já falecido Yahoo! GeoCities. Funcionava mais ou menos como um blog onde eu compartilhava algumas coisas que eu encontrava na própria internet. Nada demais, alguns gifs animados e links.
Quem viveu aquela época, talvez possa recordar como era difícil ter acesso as coisas legais. Não tinha YouTube e o mais perto que a gente podia chegar de algo semelhante a um serviço de streaming eram as redes P2P para baixar MP3. O Google ainda não era popular no Brasil porque mal havia sido lançado no ano anterior, e buscador era o Cadê ou o Altavista. Os internautas mais interessados compravam, nas bancas de jornais, revistas impresas que traziam listas de sites para você conhecer.
Era tudo muito precário se comparado com o que temos hoje em dia, mas ainda assim eram dias promissores. Tão promissores quanto preocupantes para algumas pessoas.
Parece aceitável dizer que cada época manifesta seus medos através de expressões artísticas como os livros ou o cinema. Para você ter uma ideia desse temor ao qual eu estou tentando me referir, vamos lembrar que em 1999 foram lançados os filmes Matrix e O Décimo Terceiro Andar. Ambos falando sobre mundos distópicos em que a realidade é uma simulação de computador. Nas livrarias, a ficção científica voltava a roubar a cena com romances sobre sociedades baseadas em alta tecnologia e colônias espaciais em títulos como os da trilogia Neuromancer de William Gibson - sem falar do resgate de obras clássicas como aquelas escritas por Isaac Asimov como Eu, Robô e a trilogia Fundação. O contraponto ficava por conta da fantasia de O Senhor dos Anéis de J.R.R. Tolkien.
Naquela mesma época, eu li O Mundo Assombrado pelos Demônios de Carl Sagan e eu me sentia realmente entusiasmado com o futuro - seríamos mais lúcidos, mais gentis, mais preocupados com as nossas ações e mais comprometidos com o pensamento crítico. Seríamos uma sociedade emancipada, intelectualmente falando.
Nos anos seguintes, eu me aventurei por pelo menos três blogs, um podcast e eventuais aparições no YouTube, uma longa presença nos primeiros anos do Twitter e do Facebook, sem falar das longas discussões que eu tive em algumas comunidades como Puta Merda, Sou Nerd ou Odeio Acordar Cedo, tão bem acolhidas pelo agora extinto Orkut. Passei muitas horas no ICQ, MIRC e MSN.
Eu tinha uma impressão muito sólida de que eu fazia parte de uma minoria entusiasmada. A maioria das pessoas que eu conhecia parecia não estar muito interessada - ou receosa - em relação ao mundo on-line, principalmente a parcela mais velha – que haviam chegado à vida adulta antes mesmo de existir a tal da internet.
Em algum momento, todo aquele meu entusiasmo esfriou. Alguma coisa parecia não estar indo muito bem. Foi ficando cada vez mais evidente que o ambiente na internet, principalmente nas redes sociais, passou a ser, digamos, desagradável. Aquele espírito “olha que legal” deu lugar a um sentimento de “quem nós vamos esculachar hoje?“. De repente, eu me vi sendo atacado por pessoas no Twitter que eu sequer sabia que existiam, e por motivos tão bobos e infantis que eu cheguei a me convencer de que talvez eu estive ficando velho demais para a internet.
Assim como a paciência das pessoas, em pouco tempo o conteúdo foi ficando cada vez mais curto. Parecia que ninguém mais queria ouvir os outros ou muito menos ler aqueles textos longos que a gente compartilhava nos blogs, como este que você está lendo agora – e se você está lendo, eu não sei se te agradeço ou se lhe peço desculpas.
A coisa foi ficando cada vez mais estranha para mim, até que em 2012 eu desisti da internet, pelo menos enquanto produtor de conteúdo ou figura ativa. Fechei todas as minhas contas nas redes sociais. Apaguei meu blog, meu vlog. Pulei fora. Sumi do mapa.
Bom, as coisas mudam. Hoje, devo conhecer apenas uma meia dúzia de pessoas que não têm um perfil em alguma rede social - e metade delas tem mais de oitenta anos de idade.
Foi um longo hiato para mim, um longo tempo durante o qual eu quase acreditei que talvez as coisas pudessem mudar para eu poder voltar à internet, mas as coisas não mudaram como eu esperava (ou imaginava). A internet continua sendo um lugar bem complicado e perigoso, talvez até mais do que antes, assim como a vida off-line.
Novos tempos!
Nesse ponto eu entendi que talvez – assim como tantas outras pessoas – eu tenha, lá nos primórdios, idealizado a internet como um lugar imune ao lado mais assustador do ser humano. Acho que é por isso que tanta gente – assim como eu – parecia fugir para cá, para ter experiências virtuais que amenizassem a dureza da vida lá fora.
A internet foi ocupada e tornou-se mais real do que podemos (ou queremos) conceber. Não existe mais essa história de vida real e virtual. Está tudo misturado, como uma coisa só. E é bom dar-se conta disso logo. A vida on-line é um espelho – ainda que meio distorcido – daquilo que vivemos do outro lado da tela.
Acabei me convencendo de que estamos em um caminho sem volta. Provavelmente, eu não verei mais um mundo sem internet – e isso me deixou duas escolhas básicas: me afastar e tentar viver como algum tipo lendário de antigo grego que se isolava da polis, um recluso (idhiótis); ou então eu aceitava que eu precisava voltar para cá e ocupar o meu espaço e ser protagonista do meu próprio papel enquanto indivíduo num mundo interconectado.
Então, em 2019, escolhi retornar às redes sociais, criei meu canal no YouTube, ressuscitei este site e voltei a experimentar esse velho e estranho entusiasmo em relação a produção de conteúdo.
São vinte anos nessa estrada tentando entender a Internet, o Universo e tudo mais.
Carregando mais perguntas do que respostas, seguirei tentando.